Está no ar o manifesto “Rompendo com o silêncio inconveniente – um ano de massacre do povo palestino”, elaborado e assinado por organizações ecumênicas, inter-religiosas e de direitos humanos. O documento traz uma forte crítica à situação vivida pelo povo palestino e faz um apelo por mobilização internacional, destacando a urgência de uma resposta diante da violência. Além de denunciar o papel de governos e entidades internacionais, o manifesto propõe reflexões importantes sobre as implicações religiosas e políticas do conflito. Além das entidades signatárias, também aderiram ao manifesto 47 lideranças ecumênicas e de direitos humanos nacionais e latino-americanas.
A elaboração do manifesto e a mobilização para a coleta de assinaturas tiveram origem em um evento online realizado no dia 21 de outubro, divulgado com o mesmo nome do documento, “Rompendo com o Silêncio Inconveniente”. Organizado pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), o encontro teve o apoio da Embaixada Palestina, da Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos (AMDH), do Fórum Ecumênico ACT Brasil e da Red CLAI (Conselho Latino-americano de igrejas), e promoveu um diálogo sobre os desafios enfrentados pelos territórios palestinos. O evento teve mediação e apresentação da Bispa Magda Guedes e da pastora Romi Bencke, representando o CONIC, e de Enéias da Rosa, secretário executivo da AMDH.
A atividade contou com importantes falas, como a de Varsen Aghabekian, Ministra de Estado dos Negócios Estrangeiros e Expatriados da Autoridade Palestiniana, de Dr. Jack Sara, presidente do Bethlehem Bible College, de Dr. Metri Raheb, fundador e presidente da Universidade Dar al-Kalima em Belém e Amira Hanania, coordenadora do Comitê Presidencial das Igrejas na Palestina. A partir da escuta sobre a situação dos ataques e do massacre de civis, as organizações e igrejas do movimento ecumênico e de direitos humanos se posicionaram frente à gravíssima situação.
Momento de escuta
A Ministra Varsen Aghabekian destacou em sua fala a necessidade de reconhecimento internacional e ação das igrejas e organizações para pôr fim ao genocídio do povo palestino. Segundo Varsen, o cenário se agrava a cada dia: “A situação tem apenas deteriorado, se tornado cada vez mais brutal, sem precedentes, um derramamento de sangue como nunca visto na história. […] Esta reunião é um esforço contínuo para comunicar as igrejas brasileiras que a propagando israelita está abusando e acometendo nossas instituições, queremos que as igrejas apoiem essa iniciativa global a favor da paz e contra a discriminação […] A comunidade cristã não pode ficar em silêncio e parte do trabalho que vocês estão fazendo nos apoia nisso. Precisamos de sua ajuda para construir uma rede de igrejas. Precisamos que reconheçam esse genocídio e nos ajudem a terminar essa guerra” apontou a ministra.
O presidente do Bethlehem Bible College, Dr. Jack Sara, trouxe um panorama sobre o cenário de guerra na Faixa de Gaza, detalhando os horrores vividos pela população palestina e o avanço desenfreado da violência na região. “Precisamos enfrentar essa severa crise humanitária que está destruindo famílias. As comunidades estão enfrentando muita violência e morte. Hoje de manhã estava olhando as notícias e as únicas coisas que consegui ver foi uma pessoa morrendo atrás da outra. Às vezes não são apenas uma, são de dez em dez, centenas de pessoas morrendo de uma vez. Isso deixa meu coração partido […] Muitos cristãos ainda estão do lado do genocídio. Alguns crstãos não estão nem se pronunciando sobre isso. O silêncio, ou demonstrar apoio a essa violência, é inadmissível. Mais de 100 mil palestinos foram deslocados porque tiveram suas casas e hospitais atacados, e isso nos faz perguntar: até quando isso vai continuar e escalar enquanto estivermos em silêncio?” lamentou Jack.
O pastor Dr. Metri Raheb destacou a importância de refletir sobre o abandono sentido pelas pessoas que vivem sob constante violência. “Toda vez que Israel ataca Gaza, toda vez que alguém é morto ou assassinado, eu escuto algum muçulmano falando que Deus é o suficiente e é Nele que podemos confiar. Essas pessoas sabem que não estão sendo abandonadas por Deus. Elas se sentem abandonadas pela humanidade. Onde estão as organizações de direitos humanos? Este silêncio é ensurdecedor. As pessoas em Gaza não perderam sua crença em Deus, elas perderam sua crença na humanidade, e acho que como teólogos precisamos refletir sobre isso.”, contou.
O pastor luterano Dr. Walter Altmann, impossibilitado de participar do evento ao vivo, enviou um vídeo em que destacou o papel fundamental do respeito entre os povos e as religiões em momentos de conflito, enfatizando que essa é a chave para alcançar uma resolução pacífica. “Sonhos podem parecer impossíveis até que sejam possíveis. […] Nós temos o sonho de que a Palestina possa ser estabelecida como um estado livre e que os palestinos possam ser respeitados e terem uma vida digna assim como todos os outros povos”, afirmou o pastor.
Em resposta aos pronunciamentos feitos, o secretário executivo da AMDH, Enéias da Rosa destacou que é desolador para aqueles que atuam na área de direitos humanos observar a incapacidade do sistema global em conter as atrocidades que ocorrem na Palestina e na região. Ele reforçou a importância de unir forças à luta do povo palestino para a construção de um caminho de paz e reparação. Por sua vez, a pastoraRomi Bencke reforçou as questões, citando os esforços que organizações no Brasil vem fazendo para estudar e refletir sobre situações de genocídio. “Há a necessidade urgente de nós pensarmos a teologia do genocídio. Aqui no Brasil, junto com a AMDH, o Fe ACT Brasil tem refletido, por exemplo, sobre a compreensão de genocídio que vem da própria ONU, que ao nosso ver, não cabe para países que são fruto do colonialismo. Então, estamos há 2 anos debatendo sobre o que é genocídio e queremos provocar a própria ONU para reaver a sua compreensão de genocídio, que precisa ser muito mais ampla. Os fatores de risco de genocídio precisam urgentemente ser revistos” complementou Romi.
Conheça o manifesto
O manifesto publicado não apenas condena a violência e a ocupação dos territórios palestinos, mas também destaca a insuficiência da resposta de organismos internacionais diante da escalada do conflito. Com dados alarmantes, o texto denuncia que, após um ano de intensificação dos ataques, mais de 42 mil palestinos foram mortos, incluindo uma grande proporção de crianças e mulheres, além de forçar o deslocamento de milhões.
O documento também desafia as igrejas ocidentais a reverem suas interpretações bíblicas que, ao longo dos séculos, têm legitimado ideologias sionistas e colonialistas. Para os signatários, o silêncio em torno do massacre palestino é insustentável, e o manifesto busca uma ruptura desse silêncio, pedindo ações urgentes para o fim das hostilidades e a responsabilização de todos os envolvidos.
As organizações cristãs e de direitos humanos que assinam são: Aliança de Batistas do Brasil; Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil; Congregação de Nossa Senhora – Cônegas de Santo Agostinho; Coordenadoria Ecumênica de Serviço- CESE; Fórum Ecumênico ACT-Brasil; Serviço de Paz, SERPAZ – São Leopoldo; Red CLAI – Red del Consejo Latinoamericano de Iglesias; ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos; Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos; INESC – Instituto de estudos socioeconômicos; Plataforma dos Movimentos Sociais por Outro Sistema Político
Leia o manifesto completo clicando aqui.
Texto: Manoela Nunes (assessora de comunicação da AMDH)